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Planeta dos Macacos: A Guerra

War for the Planet of the Apes (EUA/ Canadá/ Nova Zelândia, 2017)

Acabou. A Guerra representa o desfecho, possivelmente, da franquia mais consistente e madura da década. Durante alguns anos presenciamos como a vida de Cesar (Andy Serkis) se confundia com a trajetória da humanidade. Fruto de cobaias da pesquisa da cura do Alzheimer, tal chimpanzé representou um marco na evolução ao adquirir habilidades cognitivas para além de sua natureza ao passo que marcara também a disseminação de um vírus que dizimaria parte da humanidade. No presente contexto, no qual a diplomacia já não se sustenta, temos o cenário pós-apocalíptico à altura das ideias apresentadas em A Origem e em O Confronto: homens que disputam entre si e com os símios a soberania de sua espécie no planeta. Não deixa de ser irônico que os soldados da, digamos, resistência, sejam mais selvagens e, mais uma vez, não deixa de ser profundamente triste constatar isto.

Neste sentido, talvez tal alegoria seja o que há de mais deslumbrante nesta trilogia sublinhado que as criaturas são inteiramente digitais mas evocam altruísmo, compaixão, generosidade, ternura, afeto... enfim, evocam verdadeiramente nossa humanidade recrutados, sobretudo, através das suas forças de expressão. Nós entendemos suas intenções a partir dos gestos, maneirismo e de suas feições. Isso é desconcertante e um feito admirável não só do ponto de vista narrativo, que construiu personagens carismáticos e complexos (que racionalizam sobre suas ações e se questionam quanto a lisura destas), mas do ponto de vista técnico também.

Posto a quantidade de planos fechados e closes em seus rostos, a empresa Weta Digital (responsável pelos efeitos digitais) continua a superar o seu próprio padrão de excelência, já constatados nos filmes anteriores desta franquia e também na extensa lista de produções nas quais já colaborou. Planeta dos Macacos: A Guerra é arrebatador visualmente e isto não deve ser encarado como algo trivial. Quantas outras experiências fílmicas que você conhece já foram sabotadas pela precariedade do realismo? E vou além, tal elogio merece ser compartilhado pela atuação em performance capture de Serkis, o qual capitania as outras performances e, do meu ponto de vista, tem muito menos reconhecimento do que deveria. Em síntese, um verdadeiro exemplo de como usar tecnologia à favor do enredo, não buscando fim em si próprio como frequentemente vemos em Hollywood.

 

 

 

 

 

Observe também que, de forma geral, até mesmo as sequências de ação são moderadas em detrimento do desenvolvimento das subtramas e das relações “interpessoais”. Não se render à pirotecnia e ao espetáculo revela ousadia e confiança no espectador, haja vista que em outras mãos poderia ser irresistível, salientando o fato da sugestão implícita no próprio título e, principalmente, de estarmos no ponto final desta jornada. A guerra de Matt Reeves é cinza, violenta, sombria, triste e trágica, e é travada mais no campo psicológico. A guerra é filha da ignorância e incapacidade do homem em dominar seu ego e de subordinar-se; e recuperando o que foi dito acima sobre a selvageria dos soldados e a integridade dos símios, infelizmente, sabemos que estas alegorias têm seus pés bem fincados no mundo real.

Entretanto, Reeves tem o cuidado de não tornar os homens excessivamente caricatos, representados na figura de Woody Harrelson. Claramente inspirado na personagem de Marlon Brando em Apocalypse Now, o genericamente intitulado Coronel ganha motivações e contornos surpreendes e controversos, adicionando ainda mais substância a história. Note como ele se apresenta predominantemente com óculos escuros, mesmo a noite, tornando-se ainda mais ameaçador. Por outro lado, de certa forma, há também momentos nos quais Reeves é bem menos sutil, como na referência mais do que explícita à paixão de Cristo. Módulo as sutilezas e contrastando com toda a tensão inerente aos acontecimentos, o cineasta surpreendentemente ainda consegue encaixar momentos de humor genuíno com a adição de um novo personagem (que encontra seu espaço na trama), mantendo, portanto, inteligente equilíbrio na atmosfera de completa desesperança.

Temos assim um filme que abraça o sci-fi originalmente, mas acolhe muitos outros gêneros e propostas de tema. Coerente em sua linguagem ao longo dos três filmes, Planeta dos Macacos chega ao fim extraindo uma pluralidade de sentimentos e, mesmo que me policie quanto ao uso de hipérboles, não há como ignorar o alcance de sua estatura e de sua unidade. De modo bem particular, confesso que sua cena final me desestabilizou completamente: um grande arco, uma personagem icônica, um grande produto do áudio-visual e de sua tecnologia chega ao fim. E sim, com ou sem Cesar, todos nós agora voltamos para casa em paz.

Brasília, 10 de agosto de 2017.

Direção de Matt Reeves. Roteiro de Matt Reeves e Mark Bombark. Com Andy Serkis e Woody Harrelson.

Planeta dos Macacos: A Guerra
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