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O Homem de Aço

Man of Steel (EUA/ Canadá/ Reino Unido, 2013)

 

Alfred Hithcock, Woody Allen, Quentin Tarantino e Terrence Malik são exemplos de cineastas que possuem uma virtuosa característica comum: em quaisquer de suas obras, somos capazes de reconhecê-los, enquanto diretores, tamanha a expressividade de suas assinaturas. Dito isto, o que me ocorreu quando surgiram os créditos finais de O Homem de Aço foi uma constatação inesperada, pois não é o diretor Zack Snyder que se sobressai, como seria natural. Com efeito, não me refiro a acrescentá-lo à lista acima, mas a estilização visual que marcou 300,Watchmen – O Filme Sucker Punch – Mundo Surreal, por exemplo, é categoricamente modesta nesta oportunidade. Assim, do meu modo de ver, Christopher Nolan é quem carimba sua influência a partir de sua obsessão peculiar em preencher lacunas e responder os por quês. Mas, antecipo, é uma herança que se mostra incompatível com Superman.

 

Entretanto, isto não é exatamente surpreendente. Abrindo-se um breve parêntese, Nolan ganhou popularidade e prestígio ao lançar nova luz sobre adaptações cinematográficas inspiradas em heróis de HQs ao conceber o universo sombrio do homem-morcego com realismo e profundidade raramente vistos até então. Eliminando qualquer vestígio do viés fantástico, amplamente conhecido a partir da literatura, Nolan apresentou Batman não como um vigilante dotado de habilidades incríveis, mas como símbolo ou expressão de uma condição moral, haja vista Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge, e em detrimento às convenções comerciais habituais entre seus congêneres. Com efeito, a identificação com o homem-atrás-da-máscara efetivou-se a partir da estratégia de torná-lo tão verossímil quanto possível, desconstruindo-se assim a sua natureza mítica sobre-humana.

 

Consoante a isto, o roteirista David S. Goyer (Batman Begins) demonstra uma preocupação equivocada em minimizar o perfil fantasioso em O Homem de Aço, possivelmente buscando reproduzir a experiência bem sucedida de outrora. Afinal, Superman é que deve ser o centro, e portanto uma estratégia mal elaborada pode afundar o projeto de modo geral. Neste sentido, racionalizo que Snyder caminha sobre uma linha tênue, e me vejo reticente em aceitar a negligência da aventura e a revalidação da proposta acima descrita.

 

Esclareço melhor. Por um lado, é plausível que a versão Henri Cavill apresente um pesar equilibrado, que além de tudo, estabelece uma oportuna ruptura com o classicismo da versão Christopher Reeve, de Superman – O Filme (acredito que Brandon Routh, de Superman – O Retorno, não cabe neste paralelismo). Por outro lado, temos a associação grosseira entre Kal-El e Cristo numa precisa tradução versão século XXI do Novo Testamento, como se, por si, já não fosse clarividente o bastante. Assim, entendemos a intenção de fazê-lo crível, mas face à sabedoria popular, os fins não justificam os meios.

 

Em uma palavra: autosabotagem.

 

Esteticamente, ao longo dos seus projetos, o diretor primou por liberdades criativas interessantes e particularmente desafiadoras, que é deveras a principal força de sua assinatura (mesmo que não seja exclusivamente sua). Ainda que carente deste ímpeto jovial, como comentado durante a introdução, O Homem de Aço é um recorte belíssimo desses pontuais momentos jupterianos, do qual destaco o fragmento apocalíptico que mergulha nosso herói entre ossadas humanas, e que conflitua fortemente aos momentos adequados ao senso comum. Por exemplo, Krypton, que é um diferencial com respeitos às demais adaptações do herói, equipara-se a Marte de John Carter – Entre Dois Mundos. Além disso, as sequências de ação são genuinamente entediantes e tornam-se mais incômodas a cada nova revista.

 

Pouco divertido, muito frenético e mal resolvido do ponto de vista narrativo e estrutural. Cavill não é marcante, mas se empenha satisfatóriamente.  Concluo observando que esta nova aventura merece respeito pela tentativa de recriar o universo, ainda que não o faça com sutileza e arrojo. Posto que a partir deste dar-se-á o alvorecer da justiça, no contexto da DC Comics, à posteriori, como segmento de um arco narrativo amplo, O Homem de Aço talvez mereça menção mais honrosa do que a interpretação que lhe cabe neste momento.

 

A qual está à altura do antônimo de super.

 

Brasília, 25 de março de 2016.

 

 

Dirigido por Zack Snyder. Roteiro de David S. Goyer. Com Henri Cavill, Amy Adams, Michael Shannon, Russell Crowe, Kevin Costner, Laurence Fishb e Diane Lane.

 

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